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Super Drags | Crítica da primeira temporada

Enfrentando um vilão de cada vez, Super Drags adentra profundamente na cultura da comunidade LGBT brasileira.

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Super Drags é a primeira série animada original da Netflix Brasil e ela já começa com ação! Não tem prelúdio de como as heroínas foram escolhidas ou quem é Vedete Champagne, responsável por elas. Já entramos de cara numa atividade criminosa que requer a ação do trio de heroínas drags. Daí em diante somos introduzidos ao universo da série e suas personagens carismáticas.

A sinopse do desenho, que não é para crianças como a Netflix enfatizou bem, é a seguinte: durante o dia, Patrick, Ralph e Donizete trabalham numa loja de departamento tendo que aguentar um chefe escroto. Mas à noite, eles aquendam a neca e se transformam nas Super Drags, Lemon Chiffon, Safira Cian e Scarlet Carmesim, prontas para salvar o mundo da maldade e da caretice, enfrentando um vilão desaplaudido a cada episódio.

E assim, enfrentando um vilão de cada vez, Super Drags adentra profundamente na cultura da comunidade LGBT brasileira. Para aqueles telespectadores novatos nesse mundo, muita piada passa despercebida, mas para as pessoas que respiram o pajubá e memes gays no geral o linguajar e as referências adotadas no desenho são muito familiares.

Memes, Celebridades e Cultura Pop

Memes e personalidades famosas do nosso meio são elementos recorrentes em Super Drags e reconhecê-los de imediato é garantia de risada na certa. A série traz para gente celebridades como Seu Peru (da Escolhinha do Professor Raimundo) Ana Carolina, a Grávida de Taubaté e até nossa saudosa Hebe, vivida por Jacinta.

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Jacinta é vida. Ela personifica muito bem a mulher heterossexual que acha que homens gays são seus bichinhos de estimação, para sempre estarem ali para entretê-las. “Eu amo os gays”.

Também tem paródia dos conservadores religiosos opressores desse Brasilzão. A repórter Jezebel é um misto de Sheherazade e Ana Paula Valadão, tão sem noção e opressora que é impossível não rir com ela.

O Profeta Sandoval bem… representa todos missionários pops da nossa TV que vivem sugando dinheiro dos seus pobres fiéis e perseguindo LGBTs. Ele ao lado de Lady Elza, uma entidade antiga que suga o highlight das gays para se auto-rejuvenescer, são os grandes vilões da história. Mas o que é o highlight? Vedete explica no primeiro episódio:

Highlight, a energia vital das gays. Toda bicha tem highlight. É o que torna elas especiais. Pintosas. Bafônicas, fechação.

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A série em si

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Os diálogos de Super Drags são ricos em piadas de duplo sentido, carregadas de referências anais, fálicas… no geral são bem sexuais. Para pessoas muito sensíveis pode ser até constrangedor em muitos momentos. É bacana ver que o pajubá (linguajar gay/trans) foi muito bem utilizado. A gente percebe que ele é algo natural ao universo da série e não palavras jogadas ao vento como alívio cômico.

E por falar em alívio cômico, o que são as aparições de Vedete Champagne? Tudo que ela fala é hilário! E não podia ser diferente, uma personagem inspirada e dublada pela lendária drag queen Silvetty Montilla, só poderia ser sinônimo de muitas gargalhadas. E Silvetty é a locutora oficial de Super Drags, o que garante sua presença constante no desenho, mesmo quando Vedete não aparece.

Goldiva quando criança e sua fada-madrinha, Vedete.

Goldiva é outra presença marcante. Afinal a história da primeira temporada gira em torno de seu show, pois Lady Elza suga o highlight dos LGBTs da cidade e somente o show da grande diva pop pode restaurar o highlight das pocs. Mas Goldiva é uma personalidade polêmica, pois enquanto sua voz é da Pabllo Vittar, sua personalidade é da Mariah Carey, ou qualquer outra diva que se porta como estrela, sendo muito antipática e metida com as pessoas ao seu redor, o que garante boas risadas também.

Show final de Goldiva.

E então chegamos as grandes estrelas da série: Patrick/Lemon Chiffon, Donizete/Scarlet Carmesin e Ralph/Saphira Cian são as estrelas do show…

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Patrick/Lemon Chiffon é o líder da trupe, nerd, baixinho e gordo, que tem baixa auto-estima e isso até vira tema do segundo episódio (Imagem é Tudo), quando ao ser rejeitado pela sua aparência por um boy que conheceu num app ele resolve alterar a forma como aparenta. O episódio é ótimo, uma crítica direta  aos altos padrões de beleza dentro da comunidade LGBT, cheio de heteronormatividade, especialmente entre os homens gays. Ao fim com a auto-estima recuperada e transformada em Lemon, a rinha declara:

O direito de imagem é inviolável e não deixaremos que nenhum monstro faça disso uma piada. Muito menos que a ditadura da beleza seja perversamente comandada pelo body shaming dos privilegiados.

Então temos Ralph/Saphira Cian, o gay padrão sarado alto que é otaku. Ralph é tão inocente e bobão que as pessoas precisam lhe explicar as coisas várias vezes. Sua história se desenvolve melhor no terceiro episódio (Cura Gay), quando seu pai o expulsa de casa e então Ralph vai para o acampamento do profeta Sandoval em busca da cura gay.

Patrick e Donizete vão para lá também, a fim de libertar os gays aprisionados e forçados a serem “curados”. Ralph percebe que o problema não é ele e que ninguém deve se curar de algo que é natural e não uma doença como o Profeta Sandoval prega, para levar LGBTs inocentes para seu acampamento de torturas e lhes arrancar seu dinheiro. No fim Ralph percebe que sua verdadeira família são suas amigas drags, a família que ele escolheu para si.

“Acabou que eu não vou ver… o final de OnePiece!” disse Safira nos braços de Lemon.

E por fim, e não menos importante: Donizete/Scarlet Carmesim compõe o time. Donizete é um boy negro, de pavio curto, que é muito engraçado nas suas interações. Para Donizete não tem tempo ruim, seja de boy ou em drag, ele não abaixa cabeça para ninguém, tanto que quando vira Scarlet ela é a primeira a socar o vilão! Mas não só de barraco vive Scarlet e quando ela quer ela solta umas pílulas de sabedoria que são riquíssimas. Mas são pílulas, porque a queen não é de perder tempo com lições de moral extensas:

Chega de colocar a comunidade LGBTQYZ e tudo mais uma contra as outras. A gente já faz isso bem demais.

E assim a gente constata como temos um pouqunho de cada uma dessas heroínas que são cativantes e possuem muita química entre si, o que dá todo o tom de amizade e amor fraternal da série. Mesmo que briguem, elas podem sempre contar umas com as outras em momentos de necessidade. E isso diz muito das nossas próprias relações com nossa família LGBT, especialmente para aquelas manas que foram postas fora de casa como o Ralph, não importa a desavença, no fim do dia seguimos unidas nos apoiando e protegendo.

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CLOSE ERRADO

Mas não só de flores vive o mundo de Super Drags. Há exageros no uso do pajubá e na sexualização dos diálogos, parecendo que é uma série gay feita para hétero ri. Claro que a série tem que ter sua parcela de piada para hétero ri, afinal a produção precisa ser universal. Netflix é uma empresa que visa lucro e só a audiência de fãs de drag, como nós, talvez não seja suficiente para justificar o investimento no desenho. Mas que esse exagero incomoda, isso incomoda.

E por isso que algumas das coisas que me chatearam na série foram os esteriótipos que eles fizeram questão de enfatizar, que é a forma como a sociedade heteronormatiava vê muitos de nossos membros: o homem negro agressivo de pênis avantajado que sempre faz barraco; e o homem gordo com baixa auto-estima que comete loucuras para se enquadrar num padrão de beleza.

Além do mais, no primeiro episódio teve uma cena que me chocou e que repercutiu negativamente entre todas pessoas com quem conversei sobre Super Drags. Quando Lemon vai salvar o criminoso desacordado, preso debaixo d’água no ônibus roubado que ia para o show de Goldiva, a drag acaricia o pênis sob a calça do bandido, ao reparar no grande volume. Isso foi um desserviço ao que defendemos, pois é um claro assédio sexual e na forma como foi mostrada normaliza esse tipo de crime, que nós LGBTs (e especialmente as mulheres) somos vítimas e tanto combatemos. Pegou mal e gerou muitas críticas negativas.

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E a grande revelação final, embora tenha sido uma surpresa, achei problemática. Pois ao revelar que a verdadeira identidade por trás de Lady Elza é do profeta Sandoval, reforçou a ideia, que muito combatemos, de que que nossos opressores são na verdade gays enrustidos e não heteros babacas como a grande maioria, verdadeiramente, é.

Por isso senti que ainda falta a Super Drags estar um pouco mais por dentro das nossas demandas e reivindicações como comunidade LGBT. Pois queremos acabar com os esteriótipos que carregamos graças a essa sociedade heteronormativa que tanto nos oprime, seja pela LGBTfobia, racismo, gordofobia e por aí vai.

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CONCLUSÃO

Com as devidas ressalvas apontadas no tópico anterior, eu achei Super Drags sensacional. Com muita crítica social FODA, que precisavam ser discutidas sem didatismo pedante e com muito bom humor. Para seu primeiro ano o saldo é mais que positivo, especialmente pela representatividade drag da animação, que escalou na sua versão original: Pabllo Vittar (Goldiva) Suzy Brasil (Juracy) e Silvetty Montilla. Para mim, sua Vedete ao lado de Donizete trouxeram os momentos mais divertidos e cômicos da série. Já quero Silvetty/Vedete narrando minha vida! Na versão em inglês são Rugirls que dão vozes as personagens: Ginger Ming (Lemon), Shangela (Scarlet), Trixie (Champagne) e Willam (Lady Elza).

ROBÔS GIGANTES!

Me emocionou muito ver os nomes de artistas que tanto admiramos e amamos o trabalho aparecer nos créditos de Super Drags. Só de rever eu me arrepio!

Créditos brasileiros.

Créditos dos EUA.

Este é o primeiro trabalho dos roteiristas de Super Drags, não dá para esperar a mesma maturidade de produções internacionais consagradas, como Os Simpsons, por exemplo. As vezes, cobramos demais de obras e artistas LGBTs. É tanta cobrança que vejo, que é como se a gente não pudesse errar ou simplesmente fazer algo engraçado. Quanta obra heterossexual tem por aí que é a zueira pela zueira e é aclamada? Nem tudo sobre LGBTs precisa ser levado tão a sério. Já é hora de mostrarmos nossas outras facetas, a nossa diversidade, que vai desde o ativismo necessário à nossa sobrevivência como o deboche que é nossa forma de manter nossa sanidade no lugar diante de tanta opressão. Embora os close errados e clichês precisem ser criticados e combatidos sempre!

Como eu acredito que as coisas vão evoluir, torço para que tenhamos novas temporadas da série e que ela reveja esses problemas apontados e continue abordando essas discussões mais sérias, sem perder o bom humor. Então, Combo Estúdio parabéns pelo ótimo trabalho com Super Drags. Como diria Vedete para o Dildo: Netflix pode introduzir mais Super Drags!

Queremos mais temporadas com muito mais episódios, porque somente cinco é sacanagem!!!

SUPER DRAGS, É HORA DE MONTAR!

Super Drags recebe: 3,5 coroas!

Se quiser ler mais sobre Super Drags, clique aqui.

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