Dando um grande passo em representatividade, a Netflix nos apresenta Special, uma série sobre um homem gay com paralisia cerebral, que enfrenta sua deficiência juntamente à sua decisão de explorar a vida adulta.
Após o sucesso de “Atypical”, série que conta a história de um jovem com autismo, ficamos ansiosos para novas abordagens com esse toque diferenciado: retratar pessoas especiais em uma série de comédia. Com o anúncio de Special observamos um passo maior ainda, a inclusão LGBT em pautas que envolvem pessoas com deficiência.
A série é inspirada no “Livro de memórias em que eu sou especial: E outras mentiras que contamos a nós” por Ryan O’Connell, que estrela a série como o não tão jovem Ryan, uma versão ficcional de si mesmo, além de escrever e dirigi-la. Um adulto de 28 que convive com a homossexualidade e sua paralisia cerebral, que não seriam grandes problemas caso não vivesse sobre os cuidados super protetores de sua mãe, Karen.
Se você espera uma comédia/drama sobre as dificuldades em se encaixar na sociedade, sendo um pobre gay com “PC” (como a condição é carinhosamente chamada na série), você se surpreenderá com uma leve e utópica comédia. Sua sexualidade não é um problema para a família, muito menos em seu trabalho, por estar em uma condição leve da PC seus desafios são muito mais corriqueiros que dramáticos e a série aproveita muito bem isso para fazer comédia, mostrando pequenas batalhas como abrir correspondências e amarrar os sapatos. A fórmula adotada leva todas essas questões para lados fáceis de serem contados, uma vez que apresentadas e absorvidas de forma orgânica para a audiência, e tudo em oito episódios curtíssimos de quinze minutos, tornando a série “maratonavel” em apenas uma manhã. Mas, por outro lado, impossibilita um mergulho em assuntos interessantes, como o aprofundamento da sexualidade e a motivação do personagem principal e muitas vezes sentimos que certos temas pairam sob o ar e poderiam ser melhor explorados na trama.
De certa forma, o melhor desenvolvimento da série não foi nem a homossexualidade e nem os desafios diários de uma pessoa com PC, a grande estrela foi a forma como retrataram a proteção que a família e os amigos têm, a necessidade de ajudar alguém que busca independem cia. O arco de Karen, mãe do protagonista, é de longe o melhor, solteira e empenhada à ajudar seu filho em tudo a enfermeira (profissão que reforça o arquétipo de cuidadora) deixa de viver sua vida para criar seu filho, porém, a zelosa mãe esquece de viver sua vida e vê na mudança de vida de Ryan uma oportunidade para se descobrir no mundo.
Enquanto os pontos fortes da série, temos a brilhante atuação de Jessica Hetch, como a já citada Karen, que aproveita cada cena para dar um show em nuances emocionais de forma natural, a atriz ainda usa de algumas janelas na narrativa e demonstra seu exímio timing para comédia. Outros personagens mais secundários também roubam a cena, como a divertida Kim, blogueira que escreve sobre aceitação do corpo feminino e a chefe má Olivia, um grande clichê das comédias que é super bem aproveitado em Special com piadas visuais e uma personalidade estridente que acompanha uma leve crítica ao mundo editorial moderno que explora a vida pessoal das pessoas para aproveitar da identificação e solidariedade do público.
Special é uma série divertida, sem muito compromisso em emocionar ou causa impacto com seus assuntos. A série possui grandes acertos que renderam comoção e risadas, como a cativante cena de sexo e os arcos familiares. Porém a sensação que ficamos é que a história não foi para lugar algum, o protagonista não passa por grandes provações e resolve a maioria de seus conflitos com facilidade, com isso fica mais fácil se identificar com personagens mais carismáticos que a série apresentou, mesmo compreendendo o tom e a proposta mais leve, que busca não problematizar tanto o personagem, existem feridas que precisavam ser “cutucadas” para enriquecer a série.
Com sua história leve e divertida, Special alcança a marca de 3,5 coroas e é uma grande aposta para uma maratona de comédia.
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